Depois do conto que postei semana passada, que diga-se de passagem foi um dos textos com bom número de visualizações aqui no blog, trago mais um da minha querida amiga que atende pelo nome de Roberta Silvestre! É uma ficção curta e bem gostosa de ler, então aí vai!
Nossa velha infância
Bom, é que na empresa em que trabalho, tem uma filial lá (em todo o Brasil, para ser sincera), e cada ano o treinamento é em uma diferente. E por alguma ironia do destino, justo no ano que entre ela escolheu fazer essa atividade no lugar que eu mais tinha raiva. E o treinamento teria duas semanas de duração. Muito tempo, para ser sincera.
Estou me referindo a minha terra natal, Recife. Não me leve a mal, eu não odiava a cidade em si, na realidade eu a amava muito e a amo, mas eu odiava o que acontecera lá, as minhas tão doloridas lembranças.
É uma história muito longa e dolorosa, que me fez prometer nunca mais voltar para lá. No entanto lá eu tinha que ficar com duas longas semanas.
O lado bom de estar lá, é que pude rever as minhas amigas de infância. Como eu sentia falta delas.
A primeira semana que estive lá, em Recife, ocorrera tudo sob controle, sem grandes traumas. O treinamento estava ocorrendo perfeitamente bem. Eu estava aprendendo bastante e me saindo bem. E isso era bom, tendo em vista que eu estava começando numa nova empresa.
Nas noites em que não tinha nada, eu visitava as minhas quatro amigas com as quais mantive contato, mesmo a quilômetros de distância.
Visitei primeiro Ângela. Foi muito bom. Achei incrível em como ela mudara. Ficou ainda mais bonita do que já era. Fui visitar a casa dela. Finalmente conheci seu marido, que ela começou a namorar há uns nove anos e de quem tanto falava com um amor invejável. E também conheci o pequeno Artur, filho deles, uma criança adorável. Fiquei feliz em conhecer a família da minha amiga. Eles vivem muito bem. Ela é jornalista e trabalho num jornal promissor e o marido dela é médico. Em fim é uma família perfeita. Devo dizer que senti um pouquinho de inveja, mas é porque eu nunca pensava em ter uma família. E quando eu pensei não deu certo mesmo, então simplesmente desistir de buscar ilusões.
Depois visitei Luana, que está noiva. Vai casar no fim desse ano. Ela está doida com os preparativos do casamento. Ela me disse que o casamento vai ser simples, já que ela e seu futuro marido não estão tão bem de vida quanto Ângela. Ela me chamou para ir ao seu casamento, mas não pude dar a certeza da minha presença. Eu não me sentia realmente confortável lá, não queria ter que voltar novamente. Posso dizer seguramente que nunca vi minha amiga tão feliz e radiante. Foi muito bom revê-la.
Por fim, saí com Clarissa e Tarciana. Ambas estão solteiras como eu. Nós três fomos a um restaurante jantar e ficamos lá até tarde. Bom, para ser precisa, ficamos até o restaurante fechar e pedir gentilmente para sairmos. Isso também não me prejudicou no curso, pois saímos na sexta e o fim de semana tínhamos livre.
Como fiquei o fim de semana livre, aproveitei para passear. Claro que fui a praia caminhar. Sempre gostei da praia e do mar. Era o que eu mais sentia falta de lá, quando me mudei. Na verdade ainda sinto muita falta.
Bom, foi nessa caminhada que as coisas mudaram um pouco. E todo aquele avalanche de sentimentos de dez anos atrás voltava com uma força incrível.
Eu estava correndo na praia, para desopilar um pouco. Quando acabei minha corrida, parei numa barraquinha de coco, para me reidratar.
Logo depois de me sentar, eu senti uma presença do meu lado. Não sei explicar exatamente, mas eu senti uma energia quente, que na hora, sem precisar me virar eu já sabia o que era, ou quem era.
Mas covarde como sou, não olhei para o lado e fingi que nada acontecera.
- Ju?!- escutei ele dizendo. Sua voz continuava macia, quente e grave como sempre. Escutá-lo chamar meu nome me fez vacilar por um momento.
O que posso dizer, é que eu pirei na hora. Tive vontade de sair de lá correndo e chorar minhas dores e mágoas no hotel. Mas isso seria infantil demais. Eu teria raiva de mim mesma se eu o fizesse.
Fingi que não escutei. É, concordo, isso foi super maduro. Mas o que mais eu podia fazer?
- Julia, é você?- novamente aquela voz de derreter um iceberg me chamou.
Dessa vez não pude ignorar, isso seria ridículo demais. Então eu me virei lentamente, fingindo incredulidade.
- Pois não?
- Poxa é você mesma. – Disse ele alegremente. – Não lembra de mim?
Fiquei quieta. É claro que eu lembrava. Mas eu não conseguia fazer nada. Meu sistema nervoso estava agindo com todas as forças.
- Sou eu, Luiz. – Disse ele. Notei uma nota de decepção na voz dele. Senti-me péssima por isso.
- Luiz! Claro que me lembro de você!- Disse fingindo surpresa e alegria. – Poxa vida, quase não te reconheço. Você mudou muito.
- Acha mesmo?- Perguntou ele divertido.
- Claro. – Falei. Mas pensei “claro, seus músculos estão definidos, você emagreceu muito, está com a barba por fazer e na época nem tinha nada, e está realmente muito gato”. – Mas sua voz é a mesma.
- Ah. Você mudou muito também. – Falou dando uma boa olhada em mim. – Faz quanto tempo que não nos vemos?
- Dez anos. – Cai na besteira de falar imediata e exatamente. Não sei ele, mas contei cada dia da nossa separação.
- Poxa, é mesmo. O que a trás aqui?
- Treinamento
- Como?- estava confuso
- Minha empresa faz um treinamento com os novatos. Cada ano é em uma filial diferente. Esse ano que entre, foi justo aqui.
- hummm. Vai ficar aqui até quando?
- Até o próximo sábado.
- Podíamos sair para conversar. Faz tanto tempo que não nos falamos. – Sua expressão era indecifrável.
- Não sei não. – Falei um pouco apavorada.
- Vamos, vai ser bom. Para nos conhecermos novamente.
Ai, essa doeu. De fato, éramos como dois estranhos. A ferida mal cicatrizada se abria novamente...
- É que tenho que preparar uma apresentação para o fim do treinamento.
- Poxa. Será que você não vai ter nenhum tempinho?
- Posso até ter, mas quando?
- Terça-feira, às seis horas?
- Pode ser. Adianto minha apresentação nesse fim de semana. Mas onde?
- Deixe-me escolher. Será surpresa. Você está hospedada aonde?
- No Palace Hotel. – Respondi ansiosa.
- Então vou te pegar no saguão, às seis horas da terça, ok?
- Está bem! –Falei vencida, novamente. Eu devia ter tentado me livrar dessa.
- Tenho que ir agora. Foi muito bom reencontrá-la.– Ele disse pagando a água de coco que tomara. – Não é que você acabou vindo para cá? Vai entender a vida.
Então ele me abraçou com um sorriso e deu um beijo no topo da minha cabeça, como fazia dez anos atrás.
- Tchau, até terça. - Despedi-me com a voz quase desaparecendo.
Ele foi embora sorrindo e acenando para mim.
- O que é que foi moça? – Perguntou o moço que vendia água de como.
Foi só então que reparei que eu chorava. As lágrimas quentes escorriam pelo meu rosto.
- Nada não, obrigada. – Então paguei o coco que mal bebi embora enxugando o meu rosto.
Quando voltei para o hotel e fiquei sozinha (minha companheira de quarto havia saído), tive outra crise. Chorei, chorei e chorei. Parecia que eu seria capaz de provocar um dilúvio. Meu coração ferido voltou a doer com muita força. Eu não agüentava mais isso. Como eu tinha sido tão estúpida a ponto de achar que ficaria tudo bem sair com ele? Pelo amo de Deus!
Era assim que eu sempre reagia ao Luiz, desde que fui embora pela última vez.
É, está ficando tudo muito confuso, sem saber o início de tudo isso e como fui para no outro extremo do país.
O negócio começou quando meus pais se mudaram para um condomínio quando eu tinha dois, quase três anos.
Na casa em frente a nossa, morava um casal simpático que logo fez amizade com os meus pais. Esse casal, Lúcia e Carlos tinham um filho, Luiz, que, diga-se de passagem, (eu não sei, pois era muito pequena para lembrar) encantou-se comigo. Ele adorava ir a nos casa para brincar com a pequena Júlia. Era a diversão dele. Talvez seja porque nem eu, nem ele tínhamos irmãos. Nossos pais riam dessa história. Achavam engraçada a nossa ligação.
E assim fomos crescendo. E ficamos muito unidos. Éramos carne e unha. Nunca nos separávamos. Considerávamos-nos irmãos. Isso quando eu tinha sete anos e ele dez.
Vivíamos um na casa do outro. Passeávamos de mãos dadas, estudávamos juntos. Ele me ajudando quando eu tinha dificuldade em alguma coisa.
Sempre falavam que éramos namorados. Sejamos sensatos, éramos crianças inocentes. E como éramos ainda muito imaturos, fazíamos caretas com tal possibilidade, como se fosse algo nojento.
Crescemos mais um pouco e como sempre, nunca nos separávamos. Agora eu tinha dez anos e ele treze. Nessa idade, Luiz teve a primeira namoradinha. Quando ele me contou, fiquei roxa de ciúmes, pois imaginei que ele não iria mais querer brincar comigo. Mas não falei nada, é claro. Perguntei o que eles faziam. Ele respondeu que andavam de mãos dadas, escreviam cartinhas um para o outro e ocasionalmente se beijavam. Disso eu não tinha gostado. Beijavam-se. A única coisa que não fazíamos, porque o resto, fazíamos há sete anos. Até comentei isso com ele e perguntei se éramos namorados. Ele pacientemente explicou que não, que éramos amigos íntimos e que ele não poderia ter duas namoradas ao mesmo tempo. Eu, jovem destemida, criança imatura, perguntei por que ele não me escolhia. Luiz não me respondeu e fiquei muito satisfeita com isso.
Mais uns três anos se passaram e Luiz teve mais algumas outras ficantes, mas não namorou mais ninguém. Nessa época percebi que não éramos como irmãos e sim mais para namorados. E eu não só o amava, pois sempre o amei como também estava apaixonada por ele. Então um dia eu disse que estava gostando de um garoto. Ele quase morre de ciúmes. Diferentemente de mim ele expressava o que sentia. Apesar do ciúme, perguntou-me como ele era. Eu, então, detalhei todos os detalhes de Luiz. Percebendo que era ele mesmo, ele disse que também estava apaixonado por uma garota. Perguntei, de má vontade, quem era ela. Então, descreveu-me perfeitamente e perguntou se devia namorar com ela. Sabendo que era eu, respondi que sim. Então ele foi até mim e beijou-me. Foi o meu primeiro beijo. Então, começamos a namorar.
Nossos pais adoraram, sempre gostaram de nos ver juntos.
Namoramos firmemente. Éramos claramente loucos um pelo outro. Acho que desde quando começamos a namorar, não teve um dia que não dizíamos que nos amávamos.
No início, no primeiro ano, era um namoro inocente. Os beijos não eram lá tão freqüentes e não passava disso. Ficávamos muito de mãos dadas e achava isso o máximo.
Luiz me respeitou muito, nunca fazia o que eu não gostava ou o que eu não estava preparada para fazer. Nunca me forçou a nada. Deve ter sido difícil para ele, já que tinha 16 anos de idade e seus hormônios devias estar pulando. Mas aos poucos as coisas ficaram mais sérias. Os beijos tornaram-se mais freqüentes, uma mão boba aqui e outra ali, amassos quando não tinha ninguém por perto, o que era muito raro.
Éramos de fato muito felizes. E o interessante, era que crescíamos juntos. Cada passo dessa fase importante da nossa vida era dado por nós dois. Éramos como a sustentação um do outro. Passávamos momentos difíceis e momentos bons unidos. Lembro-me bem de quando ele passou em engenharia. Fiquei tão feliz, que parecia que tinha sido eu que tinha passado no vestibular. Comemoramos muito nesse dia.
Era tudo muito lindo e perfeito, quase um conto de fadas. Até que meu pai deu a notícia que íamos nos mudar para o sul do país, pois tinha sido transferido. Eu não podia acreditar. Como eu iria sobreviver sem o Luiz? Era como se eu tivesse que mudar de mundo, deixar todo o meu coração para trás, abdicar-me do meu amor por causa do meu pai.
Eu chorava, chorava sem parar. Era como se as minhas lágrimas não secassem nunca. Uma dor no meu peito não cessava, um nó na garganta não desatava. Luiz tentava me consolar, mas ele mesmo estava inconsolável, seus lindos olhos derramavam lágrimas silenciosamente.
Um dia antes de ir embora, com a casa já quase toda vazia, ficamos o dia todo juntos naquela solidão. Dizemos um ao outro que poderíamos namorar a distância mesmo, que nosso amor não iria diminuir por causa de alguns milhares de quilômetros. Nesse dia prometemos que seríamos um do outro para sempre. Então ele me deu uma aliança de compromisso e começou a usar uma no próprio dedo.
No dia seguinte, quando eu estava prestes a ir embora, não parava de chorar. Parecia que eu ia derreter. E dessa vez ele não escondeu que também estava chorando.
O primeiro ano de namora a distância foi um pouco conturbado, mas deu certo. Eu confiava nele e ele em mim. Chegamos a nos encontrar em alguns feriados e as férias inteiras. A de julho ele veio para cá e a de janeiro fui para lá. Quando nos encontrávamos, o fogo nos incendiava completamente. Os amassos eram cada vez mais completos.
Bom, nas férias de janeiro que estive lá e que por algum motivo conseguimos ficar sozinhos, finalmente transamos. Foi a minha primeira vez e a dele também. Estávamos felizes, como se estivéssemos nos completado finalmente. A melhor parte mesmo foi quando estávamos deitados e a minha cabeça estava apoiada no peitoral magrelo dele, fazendo círculos com o dedo no tórax dele. Ele afagava os meus cabelos enquanto dizia:
- Quando acha que vamos nos casar?
- Não sei. Mas pretendo fazer o ensino médio lá, mas prestar vestibular aqui. Então poderemos nos casar.
- Acho uma boa idéia. Vai ser o tempo de eu conseguir um emprego. – Disse pensativo. – Quantos filhos vamos ter?
- Acho que dois é o suficiente.
- Só isso?!
- Sim. Um só pode ficar mimado. Três ou mais seria muita confusão. Então o melhor é dois, pois assim nenhum fica mimado e um pode ajudar ao outro ainda, quando éramos na época de “irmãos”.
- Concordo. Mas eu queria ter mais filhos para ter a casa cheia, alegre sempre. Queria uns quatro ou cinco.
- Você está louco?! Quem vai entrar em trabalho de parto sou eu. Três no máximo se tivermos condições de criar bem os três, de acordo?
- Tá, tudo bem- Falou contra o seu gosto.
Aquela foi de longe a noite mais feliz da minha vida. Ficamos um tempão deitados juntos na cama, planejando nosso futuro. Estávamos bem felizes o futuro que fizemos. Mas planejamos uma coisa e a vida fez outra completamente diferente.
No segundo ano que eu estava aqui, as coisas deslancharam. Começamos a brigar muito e por tudo. Quando viajei para lá, não foi tão bom. Ele me deu pouca atenção, só estudava e queria sair com os amigos para beber. Só que eu não entrava, pois ainda era menor de idade. Então ficava na casa dos pais dele chorando. Fora que conheci uma amiga dele que era super-bonita, que atiçou o meu ciúme. Mas como sempre, guardei para mim.
Depois ele teve uma crise de ciúme por causa dos meus amigos. Aí desabafei, na raiva, tudo o que eu tinha guardado para mim. Ele ficou com muita raiva. Nesse dia, Luiz disse que não agüentava mais ficar longe de mim, porque doía demais. Não agüentava mais ficar sem saber com quem seu andava, por onde e como. Não agüentava mais o meu ciúme. Aí ele terminou com uma facada no meu coração, dizendo que preferia ser só meu amigo para preservar nossa amizade de 13 anos, do que insistir num namoro que só estava desgastando nossa linda história. Simples assim, terminou comigo, literalmente. Acho que se tivessem arrancado meu coração sem nenhuma anestesia, não teria doido nada em comparação àquilo que senti com cada palavra que ele dizia. Mas eu desisti dele? Não, não desisti.
No próximo feriado que tive, eu fui lá de surpresa. Nossa, que erro cometi. Acabei de destruindo o que restava de nós.
Chegando lá, o que vejo? Um Luiz sem a nossa aliança de compromisso, e com uma garota. Não fazia nem um mês que tínhamos terminado.
Achei um insulto com a nossa história. Ele tentou falar comigo, disse que queria muito ser meu amigo ainda, como sempre fomos. Que me ama muito para ficarmos brigando sempre. Que não ia suportar ver nosso amor morrer, ver nos destruirmos.
Eu disse que tinha gastado todas as minhas economias para lutar por ele, por nós, mas que pelo visto ele já tinha me superado e eu já tinha perdido a guerra. Foi aí, que eu prometi que nunca mais pisaria naquela cidade e que não falaria mais com ele.
Então eu fui embora sem olhar para trás, odiando ele, odiando aquela cidade, me odiando e com o coração esfarelado. Ou talvez eu nem tivesse mais um. Pelo menos era o que eu sentia.
Fiquei depressiva. Demorei três anos para conseguir sair de casa. Nesses anos eu só fazia estudar e não queria saber de mais nada, nada mesmo. Nada me interessava de verdade. Tudo me parecia meramente banal, inútil, sem qualquer significado.
Tudo que pertencia ao meu passado com Luiz, encaixotei e coloquei no porão. Não consegui fazer que nem nos filmes em que a mulher queima tudo no que o homem tocou. Era uma vida que tinha ali, eu não podia acabar realmente com aquilo, eu só não podia mas ver aquelas lembranças.
Só depois de quatro anos que terminamos, foi que consegui ficar com um cara. Eu já estava na faculdade de administração. Passei a conhecer muita gente e fazia estágio também.
Cheguei a ter uns dois namorados, mas não duraram muito tempo. Eles simplesmente não agüentavam a minha amargura. Porque no fundo, eu ainda não tinha superado Luiz.
Foi apenas no terceiro namorado, que consegui ficar melhor. Ele gostava muito de mim e eu dele. Ele me deixava realmente feliz. Não lembro o que realmente aconteceu, mas terminamos. Continuamos amigos.
Eu estava chorando nesses meus devaneios, quando chegou a minha colega de quarto.
- Que foi Ju?- Perguntou preocupada com o estado lamentável em que eu me encontrava.
- Nada não, Tati. Só lembranças ruins que voltaram à tona quando voltei para cá.
- Ah, sinto muito. Quer falar sobre isso?
- Não, é o que menos quero, na verdade. Vou dormir agora, que minha cabeça está a ponto de explodir.
Passei o domingo trabalhando.
Segunda recomeçou o treinamento e quando eu menos esperava, já era terça-feira.
Tive uma febre psicológica na terça. Fui ao curso a pulso, pois era questão de responsabilidade. Só não cancelei o jantar, pois não tinha o número de Luiz. Eu ainda era capaz de lembrar o número da casa dele de dez anos atrás, mas imaginei que não seria o mesmo.
Seis horas chegou e nada dele. Seis e méis, nada. Seis e quarenta e cinco, eu já estava começando a chorar e a me movimentar para ir ao quarto dormir, quando ele finalmente chegou.
- Oi, Ju. Você está linda como sempre. – Ele veio me abraçar.
Olhei incrédula para ele. Eu estava com uma calça jeans, tênis e uma blusa azul sem-graça. Fora que meus olhos estavam inchados e o cabelo embaraçado. Não tive forças para penteá-lo. Cheguei à conclusão de que ele devia estar sendo irônico, o que me deixou ainda mais irritada.
- Tudo bem?- perguntou preocupado.
- Não muito. Acho que estou doente e você me fez esperar 45 minutos. Isso é inadmissível. – Falei mal-humorada.
- Me desculpe, mas tive uma reunião lá na empresa, não pude sair cedo, como planejei.
- Que desculpa mais clássica. – Disse ainda mais irritada.
- Mas será que você agüenta sair?- Perguntou preocupado. Ele colocou a mão na minha testa, para ver se eu estava com febre ou não. – Acho que está febril.
- Não, tudo bem. Já tomei um remédio para a febre. Já, já melhoro. – fiquei desesperada com a idéia de ele ir embora. Doía ficar perto dele mas doía ainda mais ficar longe dele no “escuro”, sem ter nenhum meio de comunicação com ele.
- Então vamos.
Ele me levou a uma pizzaria que eu amava. Além de a comida ser maravilhosa o lugar era muito aconchegante. As luzes eram baixas, o som agradável e uma decoração rústica. Quando namorávamos, íamos muito para lá. Ele lembrava, ou pelo menos assim esperava desesperadamente, que eu amava aquela pizzaria.
- Gostou? – Perguntou presunçoso.
- Amei. Faz tempo que não venho para cá.- Falei olhando cada detalhe do local e tendo boas Lembranças de uma época muito remota. – Nossa, sempre gostei muito daqui.
- É, eu sei. – disse dando de ombros.
Enquanto nossos pedidos não chegavam, conversamos um bocado, como que se fosse para amenizar todo aquele tempo que estávamos separados.
Ele perguntou o que fiz durante esses últimos dez anos. Contei que tive depressão, fiz faculdade e administração, que trabalhei em duas empresas e só.
Luiz ficou bem preocupado com a história da depressão. Até perguntou o que houve. Tive vontade de dizer que foi porque ele me deixou, me trocou por outra num piscar de olhos e não lutou por mim. Mas respondi que foi um probleminha particular.
- Mas e você? Como está? O que andou fazendo?- perguntei logo, para mudar de assunto.
- Eu estou bem, sabe? Passei num concurso e aí que trabalho. Fiz uma pós-graduação e um doutorado. Também tive alguns anos infelizes, mas só. – nesse momento a voz dele embargou um pouco.
- Você está bem agora?- perguntei entrando em pânico.
- Estou sim. – Mas um daqueles sorrisos irradiantes que fazem a outra pessoa sorrir involuntariamente. – Você está casado, com dois filhos?
- Não, solteira mesmo. – pensei “prometi que seria sempre sua, idiota”.
- Sério?! Como pode? Você está muito linda e inteligente.- disse incrédulo.
- É, mas é que por causa da depressão fiquei um pouco amargurada. – “por sua culpa”, pensei. – Os caras não gostam de mulheres que ficam choramingando o tempo todo.
- Você não teve nenhum namorado por esses tempos?- Dava para perceber que ele estava bem interessado com a resposta.
- Claro que tive. Dois não agüentaram minha amargura e o outro... – Pensei um pouco. – Não lembro porque acabamos.
- Só teve namoro ruim?
- Não. Esse último foi bom. Só não lembro porque acabamos, mas ainda somos muito amigos.
Ele fez uma careta quando eu falei isso. Tentou disfarçar, mas eu entendi o porquê. Essa reação foi porque eu não quis mais ser amiga dele quando terminamos, embora ele tenha insistido nessa idéia.
- E você, está solteiro também? – Mas antes que ele respondesse completei. – Aposto que não.
- Aposta ganha. Por que imaginou que eu não estou solteiro?
- Porque você nunca fica sozinho.
- Porque acha que nunca fico só?- Estava intrigado.
- Porque você sempre foi carente. - Respondi entediada.
- Bom, eu nunca tinha pensado assim. Será que eu devia fazer terapia?- Perguntou como se estivesse brincando.
- Com certeza. – Mas respondi sério. Então ele parou de rir – Como estão seus pais?
Ele ficou imediatamente triste. Percebi que não era para eu ter perguntado, que tinha acontecido uma coisa muito ruim com a família dele.
- Minha mãe... - Limpou a garganta. Sua voz estava muito embargada. – minha mãe faleceu.
- O QUÊ?! –Fiquei atônita. Não queria acreditar. Isso doía demais. – Como? Quando?
- Faz dois anos, de acidente de carro... - Sua voz estava fraca e triste. – Eu queria que você estivesse por perto...
- Eu não acredito... – Meus olhos já estavam marejados de lágrimas. – Sinto muito... muito mesmo.
Não agüentei, comecei a chorar.
- Ei, calma. – Ele disse pegando minha mão e fez carinho nela para me reconfortar. – Tudo bem. Uma hora você acostuma.
- Mas você sofreu... – Isso para mim já era bastante ruim. – E seu pai também. Lúcia era muito boa para mim... Como uma segunda mãe...
- Eu sei...- a voz dele estava estranha também. – Vamos embora.
- Sim...Sim...- Eu fiquei tão descontrolada, que nem lembrei da conta. Ele deixou um tanto de dinheiro lá, falou com o garçon e foi embora sem esperar o troco.
Quando ele me levou para o hotel, perguntou se eu queria sair na noite seguinte com ele. Aceitei.
Ele se despediu de mim com um beijo na bochecha. Fiquei sentindo o resto da noite onde seus lábios tocaram em meu rosto, não querendo perder aquela sensação tão maravilhosa.
Luiz sempre me causava esses efeitos. Quando ainda estávamos juntos, sempre que o via, olha que era todo dia, meu coração disparava e onde me beijava, ficava quente e formigando. Na época eu me acostumara com isso, mas não nos dias em que eu retornei para Recife.
Na quarta-feira, ele me buscou no hotel de seis horas pontualmente.
- Pontual, ein? –Brinquei.
- Eu disse que ontem estava na reunião. – Ele veio até mim, abraçou-me e beijou a minha testa.
Naquela noite, Luiz me levou para a casa do pai dele. Foi uma noite muito agradável e de muitas recordações. Eu realmente sentia falta de Carlos. Ele á um homem inteligente, forte e sábio. Sempre tem as palavras certas, seja qual for a situação. Conversamos muito. Mas saímos de lá oito horas da noite.
- Está cedo ainda. – Disse Luiz quando saímos da casa do pai dele. – Vamos para onde?
- Sei lá... Para qualquer lugar... – “desde que eu esteja com você”, completei mentalmente.
- Já sei!
Acabou que me levou para uma sorveteria. E eu sou louca por sorvete.
- Adorei aqui. Sorvete sempre foi o meu fraco. – Comentei me deliciando com um banana split.
- Eu sei... – Luiz falou como se fosse a coisa mais óbvia do mundo. – Podem ter passado dez anos, poderia até ter sido mais, mas sempre vou me lembrar dos seus gostos.
Fiquei tão sem graça com a afirmação dele, que me senti corar. E mais uma vez meu coração ficou aos pulos.
- Eu também me lembro dos seus. – Finalmente falei.
- Que nada. – Provocou.
- Lembro que você queria ter cinco filhos, queria morar em casa, odeia frutos do mar, ama sorvete também, para ser mais exata, um Sunday com uma bola de chocolate, outra de morango e a última com creme de limão e a calda é de chocolate... – Falei demais, percebi.
- Certo, certo, já me convenceu que tem a cabeça boa. – Disse rindo.
- Não é a cabeça, é o coração... – Não queria ter falado isso, mas simplesmente saiu sem eu dar conta.
Ficamos sérios por um tempo e depois mudamos de assunto.
Novamente ele me levou para o hotel e me chamou para sair no dia seguinte. E como todas as despedidas, abraçou-me e deu um beijo na minha bochecha.
Na quinta, Luiz me levou para o apartamento dele. Gostei de lá. Era bem aconchegante, pequeno e prático.
- Eu mesmo fiz o jantar. – Exibiu-se feliz da vida.
- Devo ter medo?- Brinquei.
- Não. Eu comecei a gostar de cozinhar. E modéstia à parte, acho que cozinho bem. – Falou me servindo uma carne e uma salada.
- Poxa... Está bom mesmo...- Falei depois de experimentar.
Após o jantar, ficamos na sala escutando música e jogando conversa fora.
- Porque terminamos mesmo? Nos damos tão bem... – Perguntou de supetão, o que me fez entrar em choque. Nunca tocávamos na época que namoramos.
Após me recompor do choque, respondi.
- Várias coisas. Ciúme, falta de confiança, saudade, distância... – Minha voz estava rouca, esquisita. – Porque você quis e não lutou por mim, por nós como eu fiz...
- É mesmo. Éramos tão felizes...
- É verdade. Mas depois que te vi com outra garota, entrei em depressão... – Desabafei.
- Desculpe-me. Eu era muito imaturo.
- Era mesmo.
- Acha que estaríamos juntos, com casa, filhos se não tivéssemos terminado?
- Provavelmente sim...
Eu fiquei mal com toda aquela conversa. E toda a dor que demorei anos para amenizar, tinha voltado num piscar de olhos.
- Senti tanto a sua falta...- Falou acariciando a minha perna. E como eu estava de saia, era toque direto, o que não estava me deixando pensar direito.
- Eu não acredito – Falei seca e fria.
- Eu queria ter continuado seu amigo, sabe disso.
- Sei mesmo?- Estava ficando impaciente com aquela conversa toda. – O que fez para continuar meu amigo? Saiu com a primeira mulher que viu.
- Você está sendo injusta... – Disse pacientemente. O que me deixou ainda mais irritada.
- Estou?!- Naquele momento eu estava com muita raiva.
- Está. Porque eu tentei te ligar várias vezes, mas você atendeu? Não, mandava seus pais darem uma desculpa qualquer. Mandei emails, mas você respondeu? Não. – ele também estava irritado. – Você me excluiu da sua vida.
- Porque você não lutou por mim, por nós. – Eu fiquei histérica. – Foi um erro achar que poderíamos voltar a nos falar. Simplesmente não dá.
- Porque você não quer, não tenta.
- porque eu não quero?- comecei a rir sem humor.- É porque eu não consigo. Você reabriu uma ferida que durei três anos para amenizar os sintomas.
Comecei a chorar.
- Você pensa que foi a única que sofreu? Que fiquei bem com o gelo que me deu?- Perguntou muito irritado.
- Penso que sim. Mal tínhamos terminado e você já estava com outra... Foi como se quatro anos de amor e paixão tivessem sido em vão.
- Você está errada. Cada ligação que você não atendia, eu chorava e sangrava. Olhava todos os dias meu emails na esperança de você ter me respondido. Olhava o correio para ver se você tinha mandado carta. Pensa que tudo isso não doeu em mim?- Ele estava quase chorando também. – Doeu muito. Porque via o meu amor, o meu porto seguro me ignorando.
Silêncio.
- No fim você foi a culpada de tudo.
- Para mim já basta. Não agüento mais ouvir você me acusando.
- Não era o que você estava fazendo?
- Eu te amava muito. Te ver com outra me destruiu completamente. Eu não conseguia falar com você sabendo que estava nos braços de uma qualquer. Eu já estava no fundo do poço e não queria cavar mais ainda. – Levantei-me. – Eu só queria que você tivesse tentado fazer nosso namoro dar certo.
Então eu sai do apartamento dele, mais uma vez com um vazio onde era para ter um coração. Eu não conseguia respirar direito, minhas pernas estavam bambas. Peguei um táxi e fui embora. Chorando, chorando.
A sexta-feira passou se arrastando. Fiz a minha apresentação e todo mundo adorou.
No sábado arrumei as minhas malas e fui logo para o aeroporto. Não agüentava mais ficar ali. Novamente prometi que nunca mais voltaria para lá.
Fiz logo o check-in, apesar de faltar muito tempo para o embarque.
Enquanto esperava, fiquei numa livraria, o meu melhor refúgio.
Algum tempo depois, senti a presença dele na minha frente. Ignorei, fingi que não senti nada e continuei lendo.
- Ju... – Sua voz era suave, macia e triste.
Ignorei. Infantil, eu sei.
- Ju... Por favor... – pegou delicadamente o livro que eu estava lendo e se agachou para ficar na altura dos meus olhos. – Vamos conversar.
- Não agüento... – Meus olhos estavam com lágrimas.
- Eu vim... Eu vim lutar por você, por nós... – Disse pegando as minhas mãos.
Naquele momento eu consegui olhar para ele, muito chocada.
- Eu sei que você sempre me amou, assim como eu sempre te amei... Não quero, não posso perdê-la novamente... Simplesmente eu não agüentaria... – “Certo! Estou louca.” Pensei. Luiz continuou. – Não faz sentido ficarmos separados, buscando em outros corpos um ao outro.
- Não dá... – Disse friamente, embora a voz estivesse embargada.
- Como assim não dá?!- Sou voz claramente mostrava dor.
- Você tem namorada, moro do outro lado do país... – minha voz falhou.
- Eu não tenho mais namorada. Ela não fazia sentido se o que eu mais quero é você. E distância ao é nada para nós.
- Nós sabemos que é sim. Você mesmo não agüentou.
- Eu era imaturo, uma criança ainda.
- E não podemos namorar a vida inteira a distância.
- Isso é um sim?
- Isso não é nada.
- Você pode vir para cá, ou eu para lá. Não importa desde que estejamos juntos. – Beijou minhas mãos. – Nosso amor é o que importa.
- Não sei, não sei... - Estava confusa demais para tomar uma decisão.
Então anunciaram o início do embarque do meu vôo.
- Tenho que ir... – Senti um enorme aperto ao dizer isso. Mas me levantei para ir embora.
- Não me deixe... – ele pegou a minha cintura e me beijou. Foi aquele beijo longo, que nenhum dos dois queria parar. Então tudo ficou claro. Eu ia ficar com ele, mesmo que eu tivesse que ir para lua, marte, tanto faz, desde que estivesse com ele. Porque o meu mundo era ele. – Eu te amo muito, meu amor.
- Eu também... Quero você e só você. - Falei dando mais um beijo nele.
Então Luiz pegou no bolso dois anéis.
- Para o nosso novo compromisso. Mais sério e mais maduro... – Colocou o anel no meu anular.
Peguei o maior e coloquei no dedo dele.
- Que dure para sempre... – Disse muito emocionada.
- Sim, para sempre!- E me beijou.
Já estavam na última chamada de embarque quando fui embora, deixando parte do meu coração com Luiz, meu primeiro e único amor.
Poxa...Que história linda..Se bem q dá uma curiosidade pra saber o q vem dps...kkkkkkkk,tipo,como seria...kkk,mas é bom q a fica na curiosidade :3
ResponderExcluiradoro o blog passei pra da um bjo
ResponderExcluirAdorei o texto:)
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